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PJ Vulter - Just Read It

Escrever não é para todos. Será para mim? Eu penso que sim... Neste espaço escreverei sobre isso; sobre a aventura da escrita, e dos escritores, e daquilo que eu escrevo. Tudo o que lhe peço é: Just Read It

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Novo Romance

Armagedão

28.02.20 | PJ Vulter

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Acreditam em OVNIS ou em vida extraterrestre?

São duas coisas diferentes… Quem acredita em OVNIS – necessariamente – acredita em vida extraterrena; mas o contrário não é exatamente igual. Mas isso é outra discussão… Seja como for, uma das razões evocadas pelo detratores da teoria OVNI e da existência de vida alienígena é o facto de nunca termos sido visitados – oficialmente, entenda-se – por uma civilização interestelar. No entanto, há uma resposta que é dada a isso e que é tão simples que quase parece piada: considerando tudo aquilo que nós, humanos, fazemos uns aos outros, eles têm medo do que nós lhes possamos fazer a eles…

Faz pensar…

A verdade é que a humanidade tem vindo matar-se desde o início dos tempos…

Só nas duas guerras mundiais atingiu-se o número de 105 milhões de mortos; e, entre eles, 5 milhões de judeus (na segunda guerra Mundial), vítimas do genocídio Nazi. Mas de acordo com algumas fontes, entre guerras de configuração mais ampla e as diversas guerras civis que povoam a nossa História, a humanidade assassinou mais de 600 milhões de pessoas; e grande parte destes números apenas contam as baixas militares, ignorando o número de civis – vítimas silenciosas de outras violências e mortes – que caíam, e que ainda caem nas guerras de hoje, varadas pelos conflitos dos outros. Por isso, estes 600 milhões são - na minha perspectiva - contas, francamente, feitas por baixo…

No entanto, a História constrói-se todos os dias e aquela História que gerou os 600 milhões de mortos continua a construir-se e a gerar mais mortes. Há imensos conflitos regionais com gente a morrer dia a dia...

Entre as duas Guerras do Golfo (1990 e 2003) perderam-se – estima-se - mais de 35 mil vidas; nos Balcãs, entre 1991 e 2001 (numa série de guerras regionais), mais de 100 mil pessoas pereceram; e na Síria a contagem vai nos 380 mil…

E a somar a isto, temos ainda as guerras de índole tribal; caracterizadas por uma crueldade visceral e incompreensível ao nosso olhar – dito - «civilizado». São guerras que ocorrem localmente e não são notícia porque não envolvem petróleo, ou outros bens, e não são preocupação das grandes potências. Mas lembro o Ruanda…

O massacre no Ruanda ocorreu em 7 de Abril de 1994, há 26 anos, mas o mundo ainda hoje treme ao lembrar o que viu nos noticiários, as imagens daquele genocídio terrível, levado a cabo pelos Hútus sobre os Tutsi; estima-se que mais de 600 mil pessoas tenham sido perseguidas e assassinadas à catanada - por vizinhos e conhecidos -, enquanto mais de 400 mil mulheres foram violadas. Conseguem imaginar – conceber – este cenário de horror?

Eu tenho dificuldade; e olhem que a minha imaginação viaja…

E, por fim, a ameaça que está na boca do mundo: o terrorismo. Falar em números absolutos é difícil, porque não há muita informação; há percentagens. Mas numa pesquisa, breve, encontrei alguns dados: mais de 30 mil mortos em 2014, cerca de 18 mil em 2013; as 3 mil vitimas do World Trade Center… Pergunto-me se a preferência por percentagens não será uma estratégia dos governos para não revelar números que, de outra forma, seriam francamente assustadores.

Mas não nos fiquemos por aqui…

Falemos também das pessoas que morrem, diariamente, vítimas de violência; às vezes, gratuita. No Brasil, por exemplo, morrem, por semana, 1195 pessoas, vítimas de crime violento; são cerca de 7 pessoas a cada hora. Em dados a que tive acesso, em 2012, no mundo inteiro, mais de 430 mil pessoas foram assassinadas. E, em Portugal, só de violência doméstica, foram registadas em 2019 – até Novembro – 33 mortes.

E há mais…

A OMS disse – em 2018 – que o tabagismo mata mais de 7 milhões de pessoas por ano. E disse também que o cancro seria a causa provável de morte para mais de 9 milhões de pessoas.

Um estudo publicado, em 2015, pelo New England Journal of Medicine, indica que a obesidade leva mais de 4 milhões de vidas num ano.

E, ainda, num outro estudo, a OMS indicou que – num ano - mais de 6 milhões de pessoas morrem por AVC, outros 2 milhões por diabetes e 1 milhão devido acidentes de trânsito; uma guerra que se trava todos os dias.

A humanidade – parece-me – está apostada no seu próprio extermínio. As guerras, o terrorismo, o crime violento e o trânsito são, para mim, as evidências mais gritantes de como nos odiamos uns aos outros e – talvez – a nós próprios; porque, em última instância, a nossa própria sobrevivência é posta em causa em todas, e cada uma, destas situações. É claro que os teóricos são capazes de apresentar um sem número de teorias, justificações, explicações, razões, porquês e causas para contextualizar tudo isto e eu não as ponho em dúvida nem tento refutá-las; mas faço só uma pergunta: é, ou não, verdade que, independentemente do que subjaz a tudo, nós temos vindo – e continuamos – a matar-nos uns aos outros?

Basta olharmos para uma das formas mais perversas, sub-reptícias e invisíveis de assassinato que ocorre nos nossos dias: as doenças com origem no consumo de bens e alimentos. Os governos permitem que todos nós sejamos bombardeados com informação publicitária claramente manipulada para nos fazer sentir necessidades – mas está tudo bem quanto a isso, porque é essa a função da publicidade – e nós, quando a mensagem tem sucesso, consumimos tudo aquilo que nos querem vender. E podem até achar que, quanto aos bens materiais, está tudo bem e que o problema está só no que à alimentação diz respeito… Mas não.

É verdade que a venda de alimentos processados ricos em açúcar, gorduras saturadas, químicos de conservação – muitos com efeito aditivo - e sal contribuiu, em muito, para o aumento da obesidade e das doenças a ela associadas. Mas não é menos verdade que necessidade consumista de ter coisas que não se conseguem ter – muitas vezes, por falta de recursos – tem uma consequência indirecta no consumo de alimentos; estimula o efeito da compensação; a maior parte das pessoas come e bebe para se compensar das agruras da vida.

Da mesma forma, funciona o tabagismo. O cigarro surge na vida das pessoas… bom; eu não sei porquê, porque nunca senti necessidade de fumar… Experimentei e não gostei. E o que está aqui em causa não é o que faz com que as pessoas fumem, nem o facto de fumarem, mas o processo como as tabaqueiras fazem sentir a necessidade de o fazerem. A publicidade do cigarro sempre foi distintiva; sempre fez sentir que quem fumava era diferente – no sentido positivo do termo; e tempos houve onde – ao mesmo tempo que o álcool – era publicitado livremente… Numa investigação que fiz para um dos meus romances, dei de caras com uma publicidade – antiga - onde se instigava as grávidas a fumarem… Bom; não sei… Talvez tenham sido estes exageros que obrigaram os governos a legislar sobre a publicidade ao cigarro – e ao álcool -, limitando-o a determinados períodos do dia, em televisão… Seja como for, a publicidade ao cigarro, forçada a mudar, manteve a mensagem de distinção, associada ao bem-estar, e tornou-se subliminar ao associar – discretamente -, no cinema, as características de alguns personagens ao acto de fumar… Entretanto, as pessoas tornaram-se mais alertas para os malefícios de tabagismo e as correntes sociais do «parecer bem» e do «politicamente correto» têm vindo a banir o cigarro de situações de potencial influência massiva. Seja como for, o que importa reter é que o cigarro – um consumo aditivo - continua a ser livremente comercializado, e publicitado, apesar de se saber que - só por si - mata 7 milhões de pessoas por ano.

Se atentarmos nestes últimos exemplos, sem um conflito direto – como é no caso das guerras, do crime e do trânsito – a questão do ódio pelo outro, que acima referi, parece esmorecer; mas o ódio por nós próprios só pode crescer, porque se sabemos que nos faz mal porque persistimos nestes comportamentos?

Eu cá não sei… A estupidez que anima quem produz uma coisa que sabe envenenada é a mesma de quem a consome; sabendo-a, também, envenenada. E o problema não é a falta de informação, porque hoje em dia, tirando raras excepções, a informação está disponível para quem quiser; em estudos e nos próprios rótulos dos alimentos. No entanto, que alternativas terão as pessoas; alternativas reais?

Se deixarmos de nos abastecer nos supermercados, onde compraremos os nossos alimentos?

Há mercados, feiras, praças, com alimentação menos processada; mas será mesmo melhor?

Talvez seja um pouco melhor, mas não muito: os vegetais e as frutas estarão contaminados pelos pesticidas usados, e pelos outros que caem da atmosfera; as carnes, alteradas pelos antibióticos e pelas rações, especialmente tratadas para permitirem um crescimento mais rápido do gado; os peixes, contagiados pela poluição dos mares, pelos plásticos e pelos metais pesados. Por isso, estes alimentos podem ser melhores, mas não muito; e, sem dúvida, não o suficiente, se uma ida ao mercado implicar uma deslocação razoável. E faço esta ressalva porque, nos grandes centros urbanos, são cada vez mais raros estes espaços e os que há são de acessibilidade difícil.

Por isso, nós até podemos estar conscientes da má alimentação que fazemos – e alguns de nós até podem estar a tentar minimizar isso, da melhor forma que consegue -, mas o ritmo alucinante em que vivemos, a pressão que nos é imposta para o sucesso, para o ter coisas – mesmo que não precisemos -, para a pressa de vivermos à imagem de quem idolatramos faz com que – inconscientemente ou não – ignoremos esta realidade e nos continuemos a envenenar diariamente.

E a situação do tabagismo não é diferente. A chave é nunca ter começado a fumar; mas, se se começou, a coisa complica, e muito, e por razões similares.

Parece-me que estamos num ciclo vicioso, num esquema desenhado para que vivamos neste registo; mantêm-nos pressionados neste paradigma do ter e do haver, nesta busca insana pelo material, num ritmo de vida alucinante e, desta forma, impedem-nos de pensar e de atentar no facto de nos estarem a envenenar paulatinamente.

Entre as guerras, provocadas – regra geral – pelos interesses de alguns, motivados por política ou questões étnicas; o crime, causado pela mesma razão – embora, às vezes, a desigualdade social, fruto do paradigma vigente, tenha uma forte influencia nisso; o trânsito, e as corridas loucas que são o regresso a casa (a necessidade de ultrapassar o carro da frente que até é menos potente que o nosso – ou que é mais, mas vai ali a morrer, porque «dá Deus nozes a quem não tem dentes para as partir») e os acidentes daí resultantes; a alimentação e o tabagismo e as doenças daí decorrentes; poderemos apontar, até ao momento – sem grandes erros – para mais de 658 milhões de mortes; e digo sem grandes erros, porque este número é só o resultado dos dados referenciados aqui – neste texto – e porque - estou certo, também - há muito mais gente a morrer por estas mesmas razões, em locais ermos – ou esquecidos - do mundo que, por assim estarem, não estão a ser tidos em conta. E digo-o também, e ainda, porque, a cada ano que passa, estimam-se mais 9 milhões de pessoas mortas por cancro, mais 7 milhões por tabagismo, mais 6 milhões por AVC… Preciso de continuar?

Tirando as guerras da História, anualmente, e só por via da alimentação e do tabagismo, podemos contar com mais de 25 milhões de mortes…

Seja como for, tirando aquelas guerras, o terrorismo, o crime violento e o trânsito - que são resultado da insanidade humana, mas dificilmente podemos apontar o dedo aos criminosos -, acho que a acusação – pelo menos de tentativa – de assassinato pode ser mantida sobre toda indústria alimentar e tabaqueira, porque – resultado, também, da mesma insanidade – sabem bem o que fazem e sabem bem, também, que nós pouco – ou nada – podemos fazer para nos defender, devido às circunstâncias que nos cercam e cerceiam as opções.

«Ah! E tal… Estás a exagerar!»

Talvez… Afinal, não acredito que alguém naquelas indústrias tenha interesse particular em matar-nos. Mas, então, considerando tudo aquilo que eles fazem e sabem, terei de dizer que será pura displicência continuarem a fazê-lo; e que isso – por si só - configura, também, um quadro de crime: homicídio por negligência.

Termino, apontando o facto abjecto, e incompreensível, presente em tudo isto que relatei; só para o caso de ainda não terem lá chegado ou, então, de já se terem esquecido, porque até foi com ele que comecei: somos nós - nós - quem nos estamos a matar uns aos outros…

Talvez esteja na hora de acordar para a vida...

A Longa Estrada para Casa

21.02.20 | PJ Vulter

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Agora que já estamos em Fevereiro quero agradecer a todos os portugueses que resolveram, na recta final de 2019, gastar parte do seu subsidio de Natal em combustíveis…

Não. Não trabalho em nenhuma gasolineira, nem sou accionista de nenhuma petrolífera… Não ganhei absolutamente nada com isto; antes perdi: paciência e horas de vida.

O português não prima pela gestão de prioridades e muito menos no que a finanças diz respeito; a maior parte dos portugueses vive pelo lema «chapa ganha, chapa gasta» e, nas raras oportunidades em que é aumentado, começa logo a pensar onde irá gastar aquele extra…

Estou certo de que não estou a dar nenhuma novidade; pelo menos para aqueles que seguem este tipo de temática social. Mas para aqueles a quem isto surpreende, quiçá até ofenda, vamos a factos…

Todos os meses (de Janeiro a Dezembro) se assiste a um incremento do número de veículos na estrada a partir dos dias 20-21; o motivo, para os mais distraídos, não é nenhum em especial: é o simples trânsito. Seja como for, este volume exacerbado de carros mantém-se – sensivelmente – até ao dia 12-15, época em que a paz regressa às estradas; vá-se lá saber porquê… No entanto, este é um ciclo que se repete mensalmente e – não tenham dúvidas – por volta do dia 20 do mês seguinte o trânsito voltará complicar-se até – mais coisa, menos coisa – ao dia 15…

Para os mais desatentos, gostaria de lembrar que a função pública – uma larga maioria dos assalariados nacionais – recebe os salários por volta do dia 20 e que uma parcela dos portugueses que trabalham no sector privado, em grandes e médias empresas, recebem a sua avença, ali, entre os dias 25 e 30, e ainda que alguns trabalhadores de pequenas empresas poderão só receber o ordenado nos primeiros dias do mês seguinte; e isto faz com que os portugueses tenham as suas carteiras mais cheias – precisamente – entre o dia 20 e o dia 10 do outro mês. Será mera coincidência que seja entre o dia 10 e o dia 15 que as estradas se esvaziam?

Não me parece…

Não acham que isto merece alguma reflexão?

Se as estradas voltam a ficar mais transitáveis, a partir do dia 15, não é porque um largo volume de pessoas passou a ficar em casa; é porque passaram a usar outro meio de transporte. Sim; porque nos transportes públicos assiste-se ao fenómeno oposto: partir do dia 15, torna-se quase impossível andar de comboio, Metropolitano, barco, autocarro… Porque será?

Porque os salários, a partir do dia 15, começam a ficar curtos para sustentarem a tendência bebedora dos vários BMW’s, Mercedes e outros veículos de alta cilindrada que inexplicavelmente povoam as nossas estradas. E, a partir daí, os mesmos indivíduos que invadiram as estradas invadem os transportes públicos; para os quais até compraram o passe.

O povo tem uma expressão para isto: «Gastar a dois bicos»!

Depois ouvem-se criticas: os portugueses não poupam. E os portugueses respondem: não ganhamos suficiente para poupar…

A sério?!

Com este comportamento não admira…

A mim – parece-me – que quem vai de transporte público para o trabalho, vai de transporte público; não vai de automóvel. Tal como quem vai de automóvel, não vai de transporte público. É claro que às vezes há circunstâncias que nos obrigam a trocar o meio de transporte… Enfim, o que eu quero dizer é que não faz sentido, face ao investimento que é necessário, quer para uma coisa e quer para outra, fazer os dois investimentos. Mas é isso o que se passa hoje em dia…

Mas falava eu do Subsídio de Natal…

A par com aquele prodígio acima referido, verifica-se um outro fenómeno; este de características sazonais. Ali, entre os meses de Junho e Agosto, e depois, em Novembro. Em ambos os casos, tudo começa por volta do dia 20 e arrasta-se - pelo mês seguinte, no caso do Verão, até ao mês por excelência de férias - e, no segundo caso, até ao final do mês. E isto tudo, porque o português recebe o subsídio de férias e o IRS, no caso primeiro, e o subsídio de Natal, no caso segundo; está de carteiras a abarrotar…

Não está?!

Peço desculpa; é que parece…

Porque vejamos, é certo que se tem direito a algum conforto – indo de carro, e tal -, mas será que esse é um conforto real?

Em Novembro, a partir do dia 20 - e até ao final de Dezembro -, nunca levei menos de que 1h15m a chegar a casa; uma viagem que – regra geral – faço em 35m. E, tal como eu - estou certo -, houve muito mais pessoas, incluindo esses habituais utilizadores periódicos da estrada, que viram o seu tempo de viagem alongado; com o consequente desgaste e stress…

Terá mesmo compensado investir o subsídio de Natal em combustível?

Não teria sido melhor gastá-lo em prendas?

Ah! É verdade; para isso há o cartão de crédito…

O Peso do Caminho que se fez para trás...

14.02.20 | PJ Vulter

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Nós somos a súmula das nossas escolhas… No entanto, quando chegamos à idade adulta, poucas dessas escolhas foram nossas, de facto; e, outras, nem foram verdadeiras escolhas.

Grande parte da nossa infância foi condicionada pelos nossos pais. Aquilo que era visão do mundo dos nossos pais foi transferida para nós, através do processo natural de educação, e nós aceitámo-la; pelo menos, até ao momento em que tivemos liberdade para pensar pela nossa própria cabeça. Mas, por essa altura, já houve escolhas feitas pelos nossos pais, em nosso nome – e isto é natural, porque somos crianças e temos de ser ensinados –, e outras que, ainda que feitas por nós, foram condicionadas por eles; quer em termos educacionais, quer em termos de opiniões… A verdade - atentem bem - é que quando chegamos à idade adulta – e estou a considerar para esse marco o momento em que começamos a trabalhar – poucas das nossas escolhas foram de facto nossas, porque, quando começámos a ter liberdade para escolher, esse processo foi sabotado a dois níveis: sub-repticiamente, pela educação – a parental e a escolar - que nos condicionou a mente em termos dos paradigmas vigentes; e, diretamente, pela vida, pelas condições económicas, e outras, que nos circundaram, limitaram, condicionaram e que – necessariamente – continuarão a fazê-lo. Por isso, não houve – nem há - verdadeiras escolhas para ninguém…

No momento de uma escolha, tudo aquilo que nos construiu enquanto individuo, é evocado e – em teoria – a nossa escolha será resultado da nossa personalidade; escolheremos, por isso, o melhor para nós. Contudo, e ignorando o facto de nesta dinâmica a escolha já estar condicionada por tudo aquilo que somos, há factores externos com um poder impactante brutal e que podem nada ter que ver com quem nós somos: os nossos recursos. Quantos de nós já optámos por aquilo que designámos de segunda escolha?

Por vezes, apesar de sabermos qual é a escolha ideal, não a podemos fazer por falta de recursos. Estes recursos podem ser financeiros, mas há também outro tipo de recursos com poder limitativo; como a saúde, a idade, os estudos… E é por isso que, quando atingimos a idade adulta, para além de sermos o resultado de escolhas que não são inteiramente nossas, as nossas futuras escolhas, por consequência, já se encontram comprometidas …

Cada escolha que nós fazemos, excluí oportunidades da nossa vida; é assim que funciona: escolhemos um caminho, uma opção, uma oportunidade; as outras perdem-se. Poderão voltar a surgir no futuro?

Talvez… Mas se pensarmos que nossa escolha vai dar-nos determinados recursos, também entenderemos que os recursos das escolhas que não fizemos estarão a ser subtraídos do nosso universo de oportunidades. O Tempo, para nós, é uma linha recta num só sentido; e isso significa que mesmo que uma oportunidade perdida se assome mais à frente – no futuro – será também mais evoluída que aquela que perdemos e exigirá recursos que possivelmente não teremos. Se considerarmos isto, então perceberemos que a nossa escolha, lá atrás, traz um conjunto limitado de oportunidades para o futuro que estão intrinsecamente relacionadas com a nossa primeira escolha; e que, à medida que formos avançando na recta, mais difícil será conseguirmos voltar atrás e maior será o nosso condicionamento à primeira escolha.

Parece dramático…

Não. Só o será para quem não se revê neste sistema. Mas a maior parte de nós revê-se; vê isto como natural. E é. As escolhas na nossa vida são um sistema de matrioskas e faz sentido que assim seja; principalmente num mundo virado para a especialização, globalização, resultados rápidos e sucesso… Para todos nós, o melhor caminho para a vida é recto, do ponto de partida ao ponto de chegada, com poucos – ou nenhuns – contratempos, escolhendo os estudos mais indicados para nós e que nos levarão à profissão mais adequada com o consequente sucesso maior.

Todavia, há aqueles de nós que chegamos à idade adulta e percebemos que a nossa matrioska está avariada… As escolhas que se foram fazendo não nos trouxeram para caminho do sucesso, mas para o caminho das frustrações. E é aqui que começamos a perceber que – na verdade – nunca escolhemos nada, porque tudo aquilo que fizemos foi de alguma maneira condicionado; ou pelos recursos financeiros, ou pelo que os pais pensavam, ou pela vontade de cumprirem os sonhos dos pais, ou por medo… Enfim; a fonte de razões é interminável.

Estou certo de que a maioria de nós nunca parou para pensar sobre isto; sobre a verdadeira autoria das escolhas. E é natural; é normal. É normal, porque, para além de ser um processo invisível, de alguma forma – e felizmente para alguns – as escolhas que se fizeram redundaram no melhor para nós. Ainda assim, não é assim para todos…

Aqueles de nós que sentimos que o nosso caminho de vida é outro, que as nossas afinidades são outras diferentes daquelas que existem na nossa vida, que as rotinas preferidas são distintas das que se têm, já tentámos – mais do que uma vez, estou certo – corrigir isso; e aquilo que sentimos, nesse processo, foi frustração. Mas verdade é só uma: não temos recursos para fazer as mudanças que pretendemos, porque a escolhas que se foram fazendo, ao longo da vida, condicionaram-nos a ser aquilo que somos e só isso. Teremos alternativa?

Temos… Mas isso terá custos de toda a espécie; e, quanto mais à frente na recta do Tempo levarmos a cabo esta mudança, mais altos serão, porque os recursos necessários serão cada vez maiores. E é aqui que começa o drama…

Que farão, aqueles de nós, que, por uma questão idade, de saúde, ou até financeira, não pudermos levar a cabo essa nova jornada, por não termos forma de suportar os custos da mudança?

Bom… Se pensarmos que foram as más escolhas que fizemos que nos trouxeram aqui – numa atitude hipócrita, considerando o que aqui foi escrito -, haverá um certo conformismo; mas, se virmos a coisa da perspectiva aqui abordada, teremos de nos questionar sobre a verdadeira autoria das escolhas que nos conduziram a esta situação e, por consequência, sobre quem recai a verdadeira responsabilidade pelo nosso insustentável contexto.

E assim, a pergunta que se vem impondo desde o princípio do texto, materializa-se:

Seremos, realmente, nós, os principais autores da nossa vida?

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